por Luís Mouga Lopes
Imaginem-se num cenário de guerra, na posse de nada! O que pediriam? O livro “Uma Teoria da Justiça”, de John Rawls, fala da base moral que melhor se adequa às sociedades democráticas, propondo um contrato-social (assente na igualdade de oportunidades) entre os cidadãos. Rawls, coloca a tónica na ideia de equidade ou de reciprocidade entre os mais favorecidos e os menos favorecidos, conseguindo, assim, ultrapassar o dilema filosófico “liberdade versus igualdade”, introduzindo a justiça como conceito central.
Segundo Rawls, se dessemos a cada homem e mulher o que lhes é devido, jamais haveria mentira, guerra e hipocrisia. Se o cidadão, rico ou pobre, enquanto potencial construtor de uma sociedade justa, regressasse a uma “posição original” (ignorância), a uma posição em que todos estariam em situação semelhante e que ninguém estivesse em posição de designar princípios que beneficiasse a sua situação particular, perceberia o que seria justo e injusto. Em situação de paz social, de bem-estar social, todos os tipos de ações baseados na hipocrisia, na mentira (misericórdia) e na banalidade (consumo desenfreado) deixariam de fazer sentido… deixariam de fazer parte dos objetivos das sociedades, então livres.
Relembro esta reflexão, porque há coisas que as pessoas desejam e dizem que não fazem sentido! O conflito é uma delas; a hipocrisia uma das outras tantas. Ouvir comentários de certos políticos (os mesmos de sempre) a julgar, hoje, aquilo que ontem defenderam, deixa-me perplexo. Ver gente, como o ex-chanceler alemão socialista Gerhard Schroder, por exemplo, agora Presidente da Gazprom, a enviar recados aos europeus, deixa-me confuso, pois é gente como esta que trai os ideais da democracia, que afasta os cidadãos do dia-a-dia da política, que é responsável pela vergonhosa e preocupante taxa de abstenção e pela ascensão dos partidos de extrema-direita radicais, que passaram a ter representação expressiva nos diversos parlamentos europeus.
Políticos que mataram o projeto social europeu; ex-dirigentes de partidos denominados “socialistas” e “democrático-cristãos”, que abriram a europa ao neoliberalismo (à dívida), criando relações submissas e contratos pouco claros com as oligarquias consentidas, gestoras de recursos naturais essenciais, como é o caso do projeto Nord Stream 2, o pipeline russo. É por estas e por outras razões que o projeto EU socialista perdeu toda a força, a voz política que lhe era exigida! É por isso que a atual EU do euro, a 27, que deveria ser o motor da Europa (até aos Urais), se encontra fraca e em guerra; nas mãos de interesses privados. É por isso, também, que Portugal tarda em se afirmar, política e economicamente. Em ser o representante legítimo da cooperação com os Países ACP (África, Caribe e Pacífico) e com os Países CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa), todos eles com fronteiras de mar, onde transitam mais de 95% dos bens comercializados no mundo.
Porém, porque já não há alternativa (não passarão) e porque os investimentos na democracia, na justiça e no setor energético são cruciais, Portugal, parceiro privilegiado nas questões da lusofonia, poderá ganhar a oportunidade de ouro de se impor como membro relevante da nova ordem que está a surgir. Se Portugal tiver a capacidade de impor uma forte e planeada estratégia, baseada nas políticas da justiça e das renacionalizações, na obtenção do controlo dos seus bens naturais essenciais; de todo o setor energético nacional, incluindo o da distribuição, das telecomunicações, dos cimentos, da distribuição postal e de mercadorias, dos aeroportos, entre outros, que levará à obtenção de fortes instrumentos económicos decisivos para a cooperação, obterá o músculo necessário para vingar num novo sistema económico que se quer justo.
Só assim, será possível pensar num futuro melhor, nas famílias (anestesia fiscal) e na reindustrialização e no investimento em empresas estratégicas (públicas e privadas) e na pulverização de capital público em setores fundamentais e prioritários da economia nacional. Uma coisa julgo certa: porque o sistema capitalista faliu, o Estado tem de passar a gerir o que é do Estado, nem que para isso, se tenha de colocar o véu da ignorância na cabeça dos entendidos do costume; na cabeça dos fazedores de guerras. Para haver paz em Portugal, na Europa e no Mundo, “nenhuma redistribuição de recursos pode acontecer, a não ser para benefício dos menos favorecidos”.