CARTA ABERTA
Sobre o estado de emergência, o reforço do combate à crise sanitária e a adoção de urgentes medidas sociais e económicas
O conjunto de subscritores/as desta carta aberta à Comissão Política do Bloco de Esquerda pretende contribuir com propostas para a reflexão e a ação pública, em torno do maior desafio com que a nossa sociedade se confronta nos tempos das nossas vidas, a pandemia provocada pelo novo coronavírus e a crise sanitária daí decorrente, com graves consequências sociais e económicas.
A crise provocada pela COVID-19 deverá prolongar-se. Segundo as previsões das autoridades de saúde, o número de pessoas infetadas deverá ainda crescer até finais de maio. As medidas de controlo sanitário não podem ser aliviadas e devem ser adaptadas à evolução da epidemia. A prioridade absoluta é evitar o contágio, proteger as pessoas, em especial os grupos de risco, e salvar vidas.
O esforço sobre-humano que muitas pessoas e entidades estão a desenvolver para enfrentar a pandemia e apoiar doentes e famílias, desde logo, profissionais de saúde e elementos dos vários níveis de serviços de emergência e de outros serviços públicos, merecem o nosso profundo reconhecimento. Fica hoje evidente para toda a comunidade o erro que tem sido a precariedade, os baixos salários, a perda de direitos em vastos setores laborais e a falta de investimento no Serviço Nacional de Saúde. Reforçar os serviços públicos é melhorar as condições de vida de todas/os e aumentar a resiliência social às crises e calamidades.
No próximo dia 2 de abril, a Assembleia da República debaterá o eventual pedido de renovação de autorização do estado de emergência. Portugal tem, há mais de uma dezena de anos, um quadro legal para enfrentar situações de calamidade e de emergência (Lei de Bases da Proteção Civil (Lei n.º 27/2006) e Sistema de Vigilância em Saúde Pública (Lei n.º 81/2009) que confere ao Governo competências para tomar todas as medidas de exceção consideradas indispensáveis. Não foi a ausência de legislação que impediu o Governo de ter avançado há mais tempo com medidas de contenção, de confinamento, de apoio sanitário e de intervenção social e económica.
O Decreto do Presidente da República (n.º 14-A/2020, de 18 de março) que estabelece o estado de emergência acrescentou, às medidas possíveis do quadro legal já existente, a suspensão parcial de direitos constitucionais, como os direitos dos trabalhadores, o exercício do direito à greve, o direito de reunião, de manifestação e de resistência ativa ou passiva.
A possibilidade que o estado de emergência dá ao Governo para suspender o exercício daqueles direitos é injustificada, não tem qualquer fundamentação na situação real do país; cria uma lógica securitária propícia a abusos e constitui uma inaceitável limitação dos direitos, liberdades e garantias, inconsequente no combate à epidemia.
Em vez de limitações aos direitos democráticos dirigidas contra trabalhadores, o combate à crise sanitária, social e económica precisa de medidas urgentes e coerentes que aumentem o combate ao contágio, mobilizem todos os meios públicos e privados para esse esforço, reforcem a capacitação do Serviço Nacional de Saúde, garantam os rendimentos das famílias, contribuam para o financiamento de medidas extraordinárias e protejam as atividades económicas mais vulneráveis.
Sem prejuízo das propostas e iniciativas legislativas já tomadas, propõe-se a adoção imperiosa das seguintes 15 medidas de emergência:
1 – Incremento exponencial dos testes à população para despiste do novo coronavírus, de acordo com a recomendação da OMS, requisitando, para esse efeito, todos os recursos científicos e produtivos nacionais que possam ser envolvidos nesse objetivo;
2 – Garantia, com a máxima urgência, dos meios de proteção necessários aos trabalhadores da saúde, sem os quais não existe combate à pandemia, com mobilização imediata da capacidade industrial disponível no país;
3 – Reconversão da capacidade produtiva das empresas com aptidão técnica para produção prioritária e em escala dos vários meios sanitários necessários ao combate à pandemia;
4 – Requisição pública das estruturas privadas de saúde e respetiva integração no Serviço Nacional de Saúde para o esforço de combate à epidemia, em alternativa à montagem de frágeis e dispendiosos hospitais de campanha, só admissível em casos excecionais;
5 – Combate eficaz a todos os crimes de especulação económica e de açambarcamento, com agravamento excecional, durante o período de contingência, da respetiva moldura penal;
6 – Obrigatoriedade de todas as empresas em laboração e de serviços em atividade, públicos e privados, terem efetivadas todas as garantias de segurança e planos de contingência exigíveis para proteção dos trabalhadores/as contra a epidemia;
7 – Proibição dos despedimentos e anulação dos cancelamentos dos contratos a prazo e a recibos verdes posteriores ao início do período de contingência;
8 – Garantia de pagamento dos salários a todos os trabalhadores das empresas que, por medidas de segurança, foram fechadas, não podendo, em qualquer caso, a remuneração ser inferior ao salário mínimo nacional;
9 – Suspensão dos pagamentos de água, eletricidade, gás, comunicações, empréstimos bancários e rendas habitacionais de trabalhadores desempregados ou em lay-off e de rendas não habitacionais, nos casos de atividades fechadas durante o período de contingência;
10 – Proibição da distribuição de dividendos aos sócios e acionistas no balanço das empresas em maio, com incentivos fiscais ao investimento desses fundos na criação de emprego;
11 – Proibição de atribuição de prémios aos gestores e quadros das empresas públicas e participadas;
12 – Estabelecimento de um imposto especial sobre os lucros, sobre as transações em bolsa e sobre as grandes fortunas, para financiamento de medidas extraordinárias de apoio a trabalhadores e pequenas empresas;
13 – Taxação solidária da parte que exceda os dois mil e quinhentos euros/mês nas pensões dos vários sistemas, durante período limitado, para reforço da capacidade da segurança social;
14 – Ativação de um plano nacional de emergência económica e social para apoio a desempregados, idosos, pessoas sem abrigo, famílias com carência habitacional e crianças;
15 – Apresentação, na União Europeia, da proposta de reestruturação da dívida pública portuguesa, para diminuição dos riscos para a economia nacional associados a uma dívida insustentável, que se agravará com a crise económica que se avizinha, e possibilitar o relançamento rápido do investimento público.
Por fim, considera-se desnecessário o prolongamento do estado de emergência nos termos formulados, e inteiramente injustificada e não fundamentada a suspensão do direito à greve, mesmo que parcial, bem como de outros direitos dos trabalhadores e do direito constitucional à resistência ativa ou passiva.
Adelino Granja, Ana Lúcia Massas, Ana Sofia Ligeiro, António Ricardo, Bruno Candeias, Carlos Marques, Carlos Matias, Constantino Piçarra, Filipa Afonseca, Francisco Colaço, Honório Marques, Joana Saraiva, João Almeida, João Madeira, Jorge Mendes, Jorgete Teixeira, José Moreira, Lisa Antunes, António Ramoa, Manuela Tavares, Maria do Carmo Bica, Mário Tomé, Pedro Abreu, Pedro Cardoso, Pedro Soares, Rui Cortes, Sílvia Carreira, Soares Luz, Teodósio Alcobia, Victor Pinto.
CONVERGÊNCIA
https://convergencia-bloco.org/
Março.2020
Plenamente de acordo acção acção e determinação juntos
GostarGostar
A democracia defende se assim
GostarGostar
Excelente
GostarGostar
Pois claro ! Abaixo com o Centrāo/Marcelăo
GostarGostar