A proposta de Orçamento do Estado (OE) para 2023 apresenta um quadro macroeconómico desfasado da realidade que determina uma escolha do Governo quanto à forma de enfrentar a crise – a da austeridade e do empobrecimento. O INE acaba de indicar que a taxa de crescimento homólogo da inflação (IPC) foi de 10,2% em outubro, o que torna praticamente inalcançável a previsão do OE de 7,4% para 2022 e muito pouco credível a de 4% para 2023. Na realidade, aumentos nominais nos salários, pensões e prestações sociais abaixo da inflação estão a originar a quebra no poder de compra da maioria da população e atiram a economia para uma eminente recessão. A transferência de rendimentos do trabalho para o capital, a degradação dos serviços públicos e o aprofundamento do desastre climático e ambiental constituem o verdadeiro cenário preparado pelo Governo para 2023.
Desconfiança, desespero, revolta individual e social, mesmo que contida, é o que está a surgir perante a narrativa do primeiro-ministro e do Governo sobre a “prudência orçamental” e as “medidas de minimização dos impactes da inflação” que não cola com as vidas sofridas das pessoas. Crises sucessivas que adiam sucessivamente as promessas de melhoria nas condições de vida, empobrecimento e perda de rendimento dos trabalhadores, com transferência direta para o capital, têm sido a marca deste início do século XXI.
Calcula-se que a transferência de rendimentos do trabalho para o capital [1] em 2022 seja na ordem dos 7,1%, a maior deste século e bem superior à que teve lugar no consulado Passos/Portas/Troika. A austeridade, que alguns chegaram a afirmar que não viria do governo PS, mas que dezenas de militantes bloquistas propuseram para análise e ação na última Conferência Nacional do Bloco, é uma realidade evidente e está a atingir drasticamente a classe trabalhadora.
A verdade é que esta maioria absoluta optou pela via da austeridade, com prioridade ao cumprimento das regras europeias (que estão suspensas!), e favorecimento fiscal ao patronato e ao crescimento dos lucros das grandes empresas das fileiras da energia, distribuição e banca, com o beneplácito da direita apesar do respetivo discurso demagógico.
António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa recomendaram ao BCE moderação no aumento das taxas de juro. Porém, a política que prosseguem tem os mesmos pressupostos: restringir a procura, o poder de compra da maioria da população, pelo aumento dos juros ou/e pela contração salarial, i.e., potenciar uma recessão que resulte num aumento da taxa de desemprego e na depreciação salarial.
Para a esquerda ecossocialista, a proposta de OE para 2023 não garante mínimos redistributivos, vai agravar os já elevados níveis de pobreza e as desigualdades sociais, corta nos salários reais, nas pensões e nos apoios sociais, não taxa os lucros especulativos nem controla os preços dos bens essenciais, não promove o investimento público na oferta de bens essenciais como a habitação, saúde e educação.
O voto contra a proposta de OE 2023 da maioria absoluta tem de ser acompanhado pela iniciativa e apoio às mobilizações sociais, elementos centrais na luta pelos salários, no combate à carestia de vida, ao empobrecimento, à emergência climática, à agressão contra a Ucrânia e ao armamentismo imperialista da NATO.
As recentes manifestações e ocupações de escolas por ativistas pelo clima, em protesto pela inoperância dos governos na COP 27 para diminuir drasticamente as emissões de CO2 e em combate à política extrativista defendida pelo ministro da Economia, António Costa e Silva, têm a nossa solidariedade e apoio, tal como a exigência de demissão do ministro que é uma exigência pela mudança da política contra o ambiente. Igualmente as lutas laborais programadas para as próximas semanas, como a dos trabalhadores da Autoeuropa, por aumentos salariais dignos, indicam o caminho da resistência e da luta contra o empobrecimento A ocupação do espaço público nas suas diversas formas deve estar no primeiro plano dos/as ativistas no confronto com a maioria absoluta parlamentar e nas várias frentes de ação e de luta.
Nov.2022
[1] Ver artigo da revista ECOSSOCIALISMO #2 “Crise exige justiça distributiva” pgs. 9 – 14.
Um pensamento sobre “OE 2023 – A POLÍTICA DA AUSTERIDADE E DA CRISE PERMANENTE”