“Os adultos continuam a dizer que devem aos jovens a esperança. Mas eu não quero a sua esperança, eu não quero que vocês tenham esperança. Eu quero que vocês entrem em pânico, eu quero que vocês sintam o medo que eu sinto todos os dias. E então eu quero que vocês atuem, quero que vocês atuem como se estivessem numa crise Quero que atuem como o fariam em uma crise. Quero que vocês atuem como se a casa estivesse a arder, porque está” – Greta Thunberg, em Davos. 25-01-2019
A crise climática passou a ser uma frase habitual mas muitas vezes não entendida em toda a sua abrangência.
A queima de combustíveis fosseis tem resultado no aumento das concentrações de gases com efeito de estufa (GEE) como o dióxido de carbono (CO 2 ), o metano (CH 2) e o óxido nitroso (N 2 O). Estes gases podem permanecer na atmosfera por muitas décadas e são causadores do aquecimento global antropogénico cujos impactos visiveis são: fenómenos climáticos extremos, acidulação dos oceanos, perda de biodiversidade, escassez de água e comida, migração climática e conflitos sociais.
Para além desta face visível este facto é mais complexo, porque ao introduzir um novo fator num sistema todo o sistema vai responder com o que se chama de “mecanismos de retroalimentação “ ou seja, o próprio mecanismo do sistema auto alimenta-se -há mecanismos de retroalimentação denominados de positivos porque aumentam ou aceleram a situação inicial e outros negativos porque são retardadores desse movimento.
Nas alterações climáticas os mecanismos que favorecem a retroalimentação ou seja que aumentam e/ou aceleram o problema, são vários, deixo aqui dois deles, retirados do relatório “Empregos para o Clima”:
1) a Terra aquece, por isso, o gelo do Ártico derrete, tornando-se água; a água absorve mais calor do que o gelo (porque o branco reflecte os raios do sol mais que o azul do mar) o que faz a Terra aquecer mais;
2) a Terra aquece, por isso, os solos congelados na Sibéria derretem; o metano fixado debaixo desses solos liberta-se, gerando mais efeito de estufa, o que, por sua vez, faz a Terra aquecer ainda mais.
Segundo a pesquisa Deadline for climate action: Act strongly before 2035 to keep warming below 2°C da European Geosciences Union de August 30, 2018 “Se os governos não agirem de forma decisiva até 2035 para combater as mudanças climáticas, a humanidade poderá cruzar um ponto sem retorno, após o qual limitar o aquecimento global abaixo de 2 ° C em 2100 será improvável, de acordo com um novo estudo. A pesquisa também mostra que o prazo para limitar o aquecimento a 1,5 ° C já passou, a menos que uma acção climática radical seja tomada.“
Quando se fala de ponto de não retorno fala-se do ponto em que nada poderemos fazer para impedir o rumo dos acontecimentos segundo o artigo Climate tipping points — too risky to bet against de 7 November 2019 “Políticos, economistas e até alguns cientistas naturais tendem a supor que os pontos de inflexão no sistema terrestre – como a perda da floresta amazônica ou a camada de gelo da Antártica Ocidental – são de baixa probabilidade e pouco compreendidos. No entanto, há evidências crescentes de que esses eventos podem ser mais prováveis do que se pensava, têm altos impactos e estão interconectados por diferentes sistemas biofísicos, potencialmente comprometendo o mundo a mudanças irreversíveis de longo prazo.”

Estes factos mostram o quanto está certa a afirmação de Greta Thunberg, em Davos em 25-01-2019.
A verdade é que tudo indica que a nossa casa está a arder e é urgente alterar quase tudo para atingir a neutralidade carbónica.
Não é uma questão civilizacional mas uma questão de sobrevivência da espécie humana. Na COP24, em 14-12-2018, Greta Thunberg disse no seu discurso:
“Vocês só falam de crescimento económico verde e eterno porque têm demasiado medo de serem impopulares. Vocês só falam em avançar com as mesmas más ideias que nos meteram nesta confusão, mesmo quando a única coisa sensata a fazer é puxar o travão de emergência”.
Na verdade o capitalismo nunca vai puxar o travão de emergência porque o sistema capitalista assenta na ideia do crescimento infinito e da acumulação de capital. Puxar o travão de emergência implica uma resposta ecossocialista.
* Sílvia Carreira

Excelente artigo!
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A Sílvia não podia ter mais e mais razão em tudo o que afirma. Neste momento, 0s EUA estão a sofrer uma das piores secas de sempre. Sobretudo a quase totalidade da metade oeste do país experimenta uma verdadeira catástrofe. Um nº crescente de agricultores já desistiu de plantar seja o que for. Os criadores de gado, incapzes de pagar os elevados peços das rações, já que não existe pasto, estão a vender ao desbarato os seus animais. Mesmo os famosos pomares e hortas da Califórnia estão a morrer à sede. Os governos estaduais já avisaram que a pouca água que resta será apenas para abastecer as casas e não para rega. A famosa barragem Hoover tem uma quota baixíssima e o lago Meade que a antecede idem. Esta calamidade obviamente está a fazer disparar os preços de todos os produtos agrícolas e a inflação conhece novos máximos todas as semanas, poderosamente alavancada também pela enorme alta da habitação. Algumas grandes cidades como LA ou NY têm vastas zonas transformadas em selvas de tendas e esses milhares de pessoas têm de se aliviar nas ruas que agora viram imensos esgotos a céu aberto de onde exala um cheiro horroroso. Por isso, muitas elites estão a fugir para o campo fazendo os preços das habitações disparar para níveis impensáveis. Enquanto isso, Biden autoriza novas perfurações petrolíferas no Ártico e em terras estaduais, ao mesmo tempo que envia as suas frotas de guerra passear-se pelo Mar Negro e pelo Mar do Sul da China, em aberta provocação às duas potências rivais.
“There’s no way like the American way”.
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