Assalto ao STOP, enquanto purga sanitária e expulsão de impuros

por Luís Vale

Fomos todos surpreendidos pela atitude musculada e, pelos vistos, cobarde do executivo de Rui Moreira em relação ao antigo centro comercial STOP (Porto). Solicitar o serviço da polícia municipal para vedar e selar aqueles espaços, sem aviso prévio, é a prova da má fé e da premeditação desta atitude.

Mas estamos a falar do quê? O espaço STOP é há dezena de anos, um espaço cultural, heterogéneo e multi-funcional, onde dezenas de jovens e menos jovens encontraram o habitat possível e propício para a sua arte. Muita da arte que foi assimilada e hoje é aceite pelo mainstream comercial e industrial, nasceu dentro daquelas paredes de espaços exíguos.

Esta atitude do executivo municipal é bem paradigmática da visão sectária que os seus protagonistas políticos têm da cidade. Ainda não tive a oportunidade de ouvir o que a Câmara diz em relação a esta situação, nem sei sequer se já se pronunciou, mas gostava de ouvir e ver Rui Moreira, pois sei que pelas palavras que irá pronunciar, pelo tom e pelas expressões faciais, se vai perceber, se vai revelar o nojo que sente pela diversidade das manifestações culturais, a sua crença nos espaços de exclusão social e, neste caso, cultural, quero dizer, a crença de que nem todas as manifestações culturais têm direito a existir e a ocupar o altar simbólico que é o centro da cidade, onde só os puros, leia-se da cultura erudita, podem aceder e permanecer.

É verdade que o STOP sempre foi um espaço polémico e, a espaços, notícia por isso mesmo. Contudo, até nessa polémica a Câmara Municipal nunca soube gerir a situação, nem foi sensível à situação precária do espaço e daqueles que se serviam e servem dele. Aquilo que a autarquia já há muito tempo deveria ter feito, em vez de estar preocupada e interessada nos possíveis negócios imobiliários e especulativos de todo e qualquer metro quadrado da cidade, era ter participado, ser agente activo e promotor, criando as condições mínimas e dignas daquele edifício para que a criação acontecesse.

Para além de tudo isto, a visão sectária impede o executivo de entender o STOP como um espaço de liberdade cidadã e pedagógica, onde as novas gerações adquirem referências estéticas e culturais, onde aprendem e partilham experiências e onde podem transformar em mais-valias as suas biografias, as suas capacidades e as suas ambições, ao mesmo tempo que se desviam e afastam de trilhos ou percursos bem mais problemáticos.

Não faz qualquer sentido aquilo que hoje aconteceu. O gosto do edil não pode ditar aquilo que é ou não é, acontece ou não, na cidade. Mais uma atitude cobarde e vergonhosa por parte do senhor que gere os nossos destinos, que sabemos detesta muito do que o Porto foi, ainda é e, com ou sem ele, continuará a ser.

Luís Vale

Um pensamento sobre “Assalto ao STOP, enquanto purga sanitária e expulsão de impuros

  1. O texto do Luís sobre o centro cultural portuense faz todo o sentido. Sempre foi política camarária (de todas as câmaras) preferir o abandono e vandalização de instalações vazias, a permitir que essas sejam ocupadas por projectos populares.
    Este facto remete para outro patamar da discussão. É patente para todos o excessivo e incontrolado poder dos presidentes das edilidades. Façam ou desfaçam o que quiserem, é praticamente impossível responsabilizá-los pelos seus desmandos sempre altamente favoráveis aos interesses corporativos e contrários aos dos cidadãos e comunidades. Daqui se conclui a necessidade imperiosa da criação de uma entidade supervisora independente com suficientes poders para contrabalançar estes e outros muitos outros actos lesivos e que vão desde o abate indiscriminado de muitos milhares de árvores até a alterações altamente (in) convenientes nos PDM para permitir aos patos-bravos construções abstrusas. Poderíamos chamar-lhe Provedor do Munícipe ou qq outra designação, desde que seja dotado dos necessários poderes e meios de intervenção para colocar um fim no interminável regabofe em que se transformou a governação autárquica. Só que nenhum partido ainda avançou neste sentido. Porque será???????

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