Uma delegação oficial da Assembleia da República, chefiada por Augusto Santos Silva e constituída por deputados do PS, PSD, IL e BE, visitou a Ucrânia, nos passados dias 2 e 3 de maio, a convite de Ruslan Stefanchuk, atual presidente do Verkhovna Rada, o Parlamento ucraniano.
A condenação da invasão da Ucrânia pela Federação Russa é inequívoca, tal como a solidariedade com o martirizado povo ucraniano. Ao fim de mais de um ano de guerra e atrocidades, a forma de a comunidade internacional contribuir decisivamente para acabar com o conflito e o martírio de mortes e destruição é tomar medidas fortes para impor um cessar-fogo e avançar para um sólido plano de paz.
Lamentavelmente, a tónica essencial da visita da delegação parlamentar portuguesa foi a de manifestar “a unidade europeia e atlântica” sobre a guerra na Ucrânia, nas palavras do presidente da AR. “A maioria dos países da Aliança Atlântica e da União Europeia, Portugal incluído, têm apoiado bilateralmente a Ucrânia, e o país tem a perspectiva de considerar que o seu lugar é no Ocidente, é na Europa e isso significa, para além de pertencer à União Europeia, ter uma certa perspectiva em relação à NATO”, referiu Santos Silva no encontro com Volodymyr Zelensky.
A delegação parlamentar caucionou esta política do governo português de alinhamento com o eixo EUA/NATO/UE interessado no prolongamento da guerra e defensor do discurso da resposta militar como a única possível, desvalorizando e desclassificando qualquer esforço para que seja imposto o cessar-fogo e um plano de paz, como aconteceu recentemente quando das declarações críticas do presidente do Brasil em defesa de uma articulação internacional pelo fim da guerra.
A única novidade da visita foi o anúncio do convite para a vinda à Assembleia da República de Ruslan Stefanchuk, logo aceite pelo próprio, e que discursará no Parlamento português. Sendo uma competência do presidente da AR fazer esse tipo de convites, nenhum dos grupos parlamentares se demarcou do convite e podia tê-lo feito. Ruslan Stefanchuk é um conhecido militante nacionalista de extrema-direita, que participou ativamente nos trágicos acontecimentos de 2 de maio de 2014, em Odessa, quando a extrema-direita cercou a Casa dos Sindicatos e incendiou o prédio onde decorria uma iniciativa antifascista. Morreram 48 pessoas e mais de 200 ficaram feridas.
Tudo isto foi aceite pelos grupos parlamentares que integraram a delegação portuguesa, a quem foi imposta absoluta “discrição”, ou seja, aceitação e silêncio.
É indecoroso que um partido de esquerda aceite participar numa delegação a Kiev que teve como objetivo dar respaldo político internacional à continuação da guerra e convidar para o Parlamento português um destacado responsável de um regime onde os membros da oposição estão mortos, presos ou no exílio.
Não houve, antes, durante ou depois da visita, uma palavra sobre a repressão brutal que o regime ucraniano desencadeia contra qualquer força de esquerda ou da oposição nesse país, ou uma clara demarcação relativamente ao convite ao criminoso nacionalista da extrema-direita Stefanchuk.
A história e os fundamentos do BE não se compadecem com qualquer confusão entre uma clara condenação da invasão russa e de solidariedade à população ucraniana, com o alinhamento na estratégia belicista da “unidade europeia e atlântica” e a inadmissível atitude de branqueamento ativo ou passivo do regime ucraniano.
É preciso dar lugar ao discurso e às ações pelo início de negociações de paz e pelo cessar-fogo imediato. Queremos Putin fora da Ucrânia e a NATO fora da Europa. Não queremos o Bloco a aplaudir Ruslan Stefanchuk na Assembleia da República.
