por José Cardoso Moura

O Ecossocialismo deve alijar a carga do desenvolvimento técnico cientifico? A pureza e a beleza de regressar ao bom selvagem de Jean Jacques Rousseau? Para o contacto com a natureza rude, regressar à sociedade pré-industrial, como se os desenvolvimentos técnico científicos fossem em si mesmos a encarnação do demónio produtivista e inimigo da natureza.

Não, não e não.

O mesmo ser humano que desenvolveu as ferramentas da pedra polida e lascada, de cobre, do bronze, do ferro e do aço, desenvolveu a análise matemática, as ferramentas dos cálculos, o conhecimento das físicas, das químicas e das medicinas, o cálculo tensorial e a teoria da relatividade geral, a biogenética, os sistemas de controlo automático e a inteligência artificial, a produção artesanal, a produção em cadeia, os automatismos, os cálculos de estrutura e  o domínio dos materiais, a agricultura de subsistência, a mecanização da agricultura, etc., é o mesmo ser humano capaz de desenvolver ferramentas para melhorar a sua habitação, os meios de transporte, a assistência social e a saúde pública, mas também para a guerra, para a agricultura intensiva, predadora e destruidora dos ecossistemas, para a produção energética com base em combustíveis fósseis ou na fissão nuclear, para o agravamento das desigualdades entre os possuidores do capital e os trabalhadores e para a destruição brutal dos equilíbrios ecológicos e da biodiversidade.

O domínio da teoria materialista dialéctica com Marx e o materialismo histórico com Engels permitiu, desde a Comuna de Paris e às experiências falhadas do chamado Socialismo Real, que o movimento dos trabalhadores tenha tentado a sua alternativa ao sistema capitalista.

De forma muito frágil, permitiu reproduzir um sistema de produção igualmente produtivista e Taylorista, baseado num planeamento dirigista e arcaico, numa cópia da divisão do trabalho capitalista.

Mas, as raízes da divisão de classes estavam instaladas no modelo do “Socialismo Real”, no funcionamento do “centralismo democrático”, da destruição da autonomia dos sindicatos face à cúpula dirigente  (vidé a Oposição Operária) e à adopção dum “Capitalismo de Estado” autocrático, tão irracional e predador da natureza como o capitalismo.

Mas, tal como nos finais do século XIX, não é a destruição das máquinas da indústria nem, no início do século XXI, a destruição do legado técnico científico e dos equipamentos industriais que é o caminho a trilhar pelo movimento dos trabalhadores.

Actualmente a classe trabalhadora tem um conhecimento dos sistemas de produção e técnico científicos imensamente superiores aos conhecimentos que a classe operária tinha no início do século XX.

Desta forma será possível destruir as bases classistas do modelo da democracia representativa e substituí-lo por uma intensa participação permanente das massas trabalhadoras organizadas em novas formas de decisão democrática, para a construção de formas avançadas de planeamento com intervenção de inteligência artificial, formas evoluídas de planeamento que tenham em atenção todas as decisões dos Conselhos de Trabalhadores, da necessidade de respeitar os equilíbrios ecológicos e a biodiversidade das espécies biológicas.

Assim, a luta pelo Ecossocialismo tem de se autonomizar face às atitudes mágicas do revivalismo das sociedades pré-capitalistas, do primarismo puritano e da falta de capacidade de integrar os avanços técnico científicos do ser humano.