“A guerra tem, contudo, o mérito de nos mostrar onde se choca, sorrateiramente, o ovo da serpente”

Intervenção de Mário Tomé na reunião da Mesa Nacional de 19.nov.2022 acerca do próximo Congresso do PEE

A participação do Bloco no Partido de Esquerda Europeu (PEE), onde se conjugam forças políticas tão diversas embora com um projecto político comum, aliás na justa linha que também levou à constituição do Bloco de Esquerda, e que representa a procura da unidade necessária para responder aos desafios que as sociedades modernas colocam e enfrentam, não tem correspondência na constituição da delegação que se propõe seja mandatada para o Congresso do PEE[1].

De nada serve dizer que é constituída pelos elementos da comissão internacional porque o desprezo pelo pluralismo começa exactamente aí. A delegação [do Bloco] ao PEE deve integrar camaradas das várias sensibilidades representadas nesta Mesa Nacional; a forma, o conteúdo e o alcance da delegação assim o exigem[2].

O Projecto de Relatório sobre a Esquerda Europeia não refere as posições do Bloco em cotejo, sempre necessário, com as posições dos vários partidos. Releva e bem o pluralismo do PEE no concerto de várias posições, mas…bem prega Frei Tomaz: as forças internas que desde a 9ª Convenção confrontaram o nosso projecto unitário pluralista e radical perderam na Convenção, mas ganharam no apelo ao centralismo autocrático e ao sectarismo.

O exaustivo documento político “Existe uma alternativa europeia”[3] angustia-se na procura de alternativas válidas e viáveis a este “sistema distorcido que será o sistema capitalista liberal”, deixando-nos como alternativa encontrar um sistema capitalista que não seja liberal nem distorcido.

Um sistema capitalista que colabore na procura de soluções não capitalistas.

Mas Mestre Keynes foi mais que devorado pelos mestres Hayek e Friedman na teoria e Augusto Pinochet, Reagan e Thatcher na promoção da prática.

A alternativa europeia alerta-nos para que um “desenvolvimento ecológico e social sustentável não pode ser alcançado dentro de estruturas capitalistas”. A sua timidez impede-a de dizer quais as estruturas alternativas.

Claro que as propostas do documento, como reformas por que lutar como resposta imediata e necessária, são importantes, mas só se inseridas numa perspectiva de construção de movimento apontado ao fim do capitalismo, necessariamente ao “governo do povo, pelo povo, para o povo” do velho Lincoln que só o socialismo pode permitir.

E na “alternativa europeia”, expressa no documento, o socialismo foi erradicado talvez porque seja mais fácil hoje prever o fim do mundo do que o fim do capitalismo.

Trata-se de colaboracionismo claro, quando mais do que nunca se torna necessário o casamento do socialismo com a ecologia; quando, ao contrário da estrela do momento Mariana Mazucato que considera que o Estado empreendedor deve assumir a liderança do combate às alterações climáticas, a própria Greta Thünberg defende, e com ela já muitos milhões de jovens, que não há defesa climática com este modo de produção.

Greta aponta, pois, o ecossocialismo para salvar, não o planeta que esse está sujeito às leis cósmicas e ri-se da gente, mas a humanidade. Salvá-la da catástrofe ambiental mas também da catástrofe social.

E, não podia deixar de ser!!! a “alternativa europeia” é anti-imperialista.

A invasão da Ucrânia num acto de guerra brutal e violador da Carta das Nações Unidas, devia ter desencadeado uma discussão séria entre nós sobre o enquadramento estratégico e político/militar de tal acto, dos seus desenvolvimentos e, de imediato, a análise do imperialismo contemporâneo, na época da guerra infinita.

Mas preferiu-se alinhar com o Milhazes e com o reforço do armamento da Europa e, logo, de Portugal para usar as sobras do Orçamento que até dá 125 € ao pessoal.

Exigir a saída das tropas russas da Ucrânia é prolongar a guerra quando o que é necessário é alcançar um acordo para a paz que os próprios EUA, no seu programa de grande Outro universal, já estão a delinear, é atirar ao lado.

De nada serve dizer não a tropas norte-americanas na Europa [4] quando a NATO é o braço armado do imperialismo e é a NATO que é preciso extinguir; não por obsolescência, mas por ser o braço armado dos crimes do imperialismo.

Esta guerra tem, contudo, o mérito de nos mostrar onde se choca, sorrateiramente, o ovo da serpente que todos dizemos repudiar e combater:

A Presidente da Comissão Europeia produziu declarações intoleráveis, mas que foram bem toleradas no Parlamento Europeu ofuscado talvez pela tarefa de armar e militarizar ainda mais a Europa.

Eis Ursula em todo o seu explendor internacionalista e integralista:

“Temos de fazer um pacto de defesa da democracia que trará à luz a influência estrangeira dissimulada de investimento sombrio; não vamos permitir que nenhum cavalo de tróia da autocracia ataque as democracias europeias” [5]

“temos de proteger as nossas democracias tanto das ameaças externas como dos vícios do interior.”

E, a fechar, “o nosso objectivo é o mundo reger-se pelos nossos princípios”.

Tipo ayatola!

Mário Tomé

[1] O Congresso do Partido da Esquerda Europeia (European Left) realiza-se em Viena, a 9 e 10 de dezembro de 2022.

[2] Foi rejeitada a pluralidade da delegação que participará no Congresso do PEE.

[3] Título do documento em debate no Congresso do PEE.

[4] Referência ao documento em debate no Congresso do PEE.

[5] Referência ao discurso no Parlamento Europeu da presidente da CE sobre o Estado da União – setembro.2022

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