A pergunta tem razão de ser tal a discrepância entre litoral e interior, entre Lisboa, Porto e Portalegre, Castelo Branco, Vila Real. Tem séculos esta dicotomia agravada nas últimas décadas apesar de toda a propaganda e a construção de muitas centenas de quilómetros de autoestradas, que rasgam o país de Norte a Sul, de Leste para Oeste. Hoje de carro depressa se chega longe, precisa-se de carro, dinheiro para a gasolina e já agora para as portagens que como sabemos não são baratas, seguindo a mesma lógica do preço da luz, do gás, da internet … em relação salário/custo de bens e serviços.
Os grandes centros populacionais concentram-se na área metropolitana de Lisboa, chegando ao Sado com uma população de cerca de 2 milhões e 900 mil; e na área metropolitana do Porto com cerca de 1 milhão e 750 mil habitantes. Considerando os últimos Censos onde foi registado uma população, no país, de cerca de 10 milhões e 200 mil, vimos que só nestas duas áreas vivem 4 milhões 650 mil pessoas, mais de 45,59% da população total.
Resta-nos o interior de Norte a Sul, pobre e envelhecido, onde falta quase tudo, eis o resultado da política de Cavaco e Silva e do seu famoso relatório Porter (relatório pago a peso de oiro a 2 economistas americanos, que vieram dizer-nos que o nosso Eldorado era o turismo), bem como a politica imposta pela CEE em relação à Indústria, à Agricultura e às Pescas. Cereja no topo do bolo, num país já tremendamente desigual. O movimento migratório do interior para o litoral já vinha de longe dos inícios dos anos sessenta do século passado aquando do surto de industrialização: Lisnave, Setenave, CUF… Anos mais tarde Construção Civil… fugindo ao mesmo tempo à miséria, à fome…
Também na Europa dita unida (UE) estes problemas são cada vez mais visíveis, cada vez mais se cava o fosso entre países ricos e países pobres, entre os países da Europa Central e os países do Sul e do Leste. No nosso caso, apesar dos rios de dinheiro que chegaram e chegam, não são canalizados para um desenvolvimento harmonioso do país e das suas regiões, na maioria das vezes vai engrossar os bolsos dos mesmos de sempre, basta ver o caso da nossa agricultura, das pescas e da indústria.
Os problemas existem e são muitos:
A emergência climática é isso mesmo emergência, as várias reuniões, conferências, cimeiras das potências mundiais têm fracos resultados, ninguém quer prescindir do “ouro negro”, mesmo que isso a curto prazo signifique a catástrofe para o planeta onde vivemos. No nosso país revelou-se trágico o abandono e modernização da linha férrea. O comboio com linha férrea eletrificada será o transporte do futuro.
A descarbonização é uma exigência imediata, não pode ser feita à custa dos trabalhadores, dos seus postos de trabalho e salários, já de si demasiado baixos. Eletrificada será o transporte do futuro, se quisermos ter futuro.
O trabalho, o pleno emprego e salários justos não são quimeras do século XIX ou XX, mas necessidades urgentes, não só para os grandes centros, mas também para todas as regiões e zonas do país. A concentração que se verifica, em vez de garantir pleno emprego e dignas condições de vida para todos, provoca o contrário, piores condições, mais miséria, mais pobreza.
No interior temos uma população envelhecida, vivendo em grande quantidade em lugares isolados, na solidão da sua velhice pobre e muitas vezes doente (O relatório da GNR é bem elucidativo). Os centros das cidades e vilas estão em muitos casos desertos e com vários edifícios públicos e degradação acentuada, não há reabilitação urbana. A juventude, na sua maioria é obrigada a procurar trabalho em outras paragens, tornando a situação ainda mais grave, não há renovação da população. Se pensarmos em jovens com formação superior ainda é mais acentuada, poucos lugares para ocupar.
A regionalização e descentralização sonho antigo, não passa de uma utopia, foi armadilhada com duplo referendo, era necessário coragem politica para rever a constituição e isso nem PR, nem PS ou PSD querem. Ficamo-nos pelos chefes das CCDRs eleitos pelos autarcas, quanto é necessário e urgente um sufrágio direto e universal.
Perante este quadro, não basta o Parlamento e o jogo parlamentarista, importante, mas, completamente insuficiente, é preciso reivindicar fora do Parlamento, apoiar de todas as formas as reivindicações e lutas dos vários setores e camadas da população:
– Pelo direito ao trabalho, pela revisão das leis laborais impostas pela troika, por uma salário mínimo justo, por pagamento justo das horas extra.
– Por um SNS reforçado, com médicos de família para todos, cuidados primários para todos, reconhecimento do papel e importância dos trabalhadores em saúde, com salários a condizer, precisamos de uma saúde mais pública, menos privada, a saúde é um direito não um negócio.
– Por uma ESCOLA PÚBLICA, com reconhecimento da sua importância e do papel fundamental dos seus intervenientes, salários a condizer.
– Por uma HABITAÇÃO digna para todos, acabar com toda a especulação imobiliária e nas rendas, verdadeiro maná, para senhorios sem escrúpulos. É necessário um serviço nacional de habitação.
– Por uma TRANSIÇÃO ENERGÉTICA justa, necessária e urgente, que defenda os trabalhadores, não permitindo despedimentos ou redução de salários. Por um desenvolvimento mais igual para todo o país, diversificando o emprego e a distribuição da população de forma a aliviar a pressão sobre as grandes zonas urbanas existentes. O futuro da energia está na produção de energia em todos os edifícios.
– Por uma JUSTIÇA, que trate todos por igual, que não prenda quem rouba um pão e deixe gozar em paraísos quem rouba bancos, empresas, bem públicos.
– Pela defesa dos DIREITOS das MINORIAS. Apesar de leis existentes, continuam a não ser reconhecidos e e a serem espezinhadas.
– Pela PRESERVAÇÃO da CULTURA e LAZER nas suas mais variadas formas, pelo apoio generalizado, direto e universal a todos de forma justa e equilibrada e não discriminatória como tem acontecido.
Tudo isto só será possível com uma sociedade organizada, mobilizada e reivindicativa em defesa dos seus interesses, exigindo, propondo, fazendo, não deixando nas mãos de poucos a sua vida, a vida de todos nós, só assim será possível termos um país com desenvolvimento mais equilibrado e mais justo para todos e não o atual, ou seja, um país harmonioso e não o que existe hoje, profundamente injusto e desigual.
* Higino Maroto

[Imagem: mapa do continente com distribuição do Indicador per Capita (IpC) do poder de compra concelhio derivado do Estudo sobre o Poder de Compra Concelhio (INE 2011)]
Isso tudo é muito bonito e certamente faz-nos muita falta, mas tal está inteiramente fora de questão. Com os sucesssivos e intermináveis resgates e cambalachos bancários, rendas absurdas, monopólios para amigalhaços, capturas de fatias do poder e tantos outros saques, nunca poderá haver dinheiro suficiente para aquilo que realmente interessa aos cidadãos.
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