
Em 1959, desde o alvor da Revolução Cubana, o cartaz gráfico foi um dos principais sistemas de comunicação e mobilização do novo poder na ilha caribenha. Cuba possuía já uma experiência gráfica que distinguia o seu design, designadamente através das caixas de charutos ou dos cartazes de cinema. Há que considerar ainda que as artes plásticas cubanas, já antes da Revolução, tinham fincada uma desenvoltura, através do trabalho de artistas como René Portocarrero (1912-1985) ou Amelia Peláez (1896-1968).

Na sua necessidade de clarificar, informar e educar, a Revolução Cubana encontrou no desenho gráfico e no cartaz uma forma de excelência para comunicar com o povo. A proposição de Fidel Castro, “Pátria ou Morte. Venceremos” foi passando em frente muito graças ao prático meio que o cartaz constituía.

O governo cubano, ciente da importância da cultura, fundou três instituições que foram basilares para o desenvolvimento do desenho no país: o Instituto Cubano del Arte e Industria Cinematográficos (através da primeira lei cultural de Fidel Castro) (1959). No mesmo ano institui-se a Casa de las Américas, destinada a promover o intercâmbio cultural com outros países da América Latina, sendo que no ano posterior se criou a revista com o mesmo nome. Em 1961 criou-se o Consejo Nacional de Cultura, com o fito da organização de eventos culturais. Estava implantada uma efervescência cultural que muito favoreceu o desenho gráfico e o cartaz, criando campos de atuação para os artistas.

O que fizeram os artistas gráficos cubanos nos seus cartazes? A dinâmica de transformação do país foi transposta para as suas criações na utilização de novas soluções. O que aliás acontecia também na música, no cinema, no bailado, na banda desenhada e em outras artes. Propostas gráficas e comunicativas utilizando soluções tanto engenhosas como simples. Ou simples porque engenhosas. As obras permitiam uma leitura fácil das mensagens, deixando espaço para a reflexão. Refira-se que a POP ART embebeu o cartaz cubano. Se, no mundo capitalista a POP ART ironizava transpondo para a arte signos da sociedade de consumo, o cartaz cubano da década de 1960, ironizava por sua vez, colocando o procedimento da POP ART ao serviço da Revolução. Foi o que fez também o artista plástico Raúl Martinez (1927-1995) que produziu múltiplos retratos de José Martí e Camilo Cienfuegos.

O cartaz cubano recorreu ao alto contraste, à serigrafia e à fotografia. E a muita inventividade. Fez o seu devido trabalho nas paredes de toda a Cuba, tendo despertado interesse no mundo das artes. Em meados dos anos 1960 era motivo de atenção na Europa.

No ano de 1979, em Lisboa, a Fundação Gulbenkian apresentou uma exposição de cartazes culturais cubanos. O artista plástico português Leonel Moura escreveu então sobre a razão de ser dos cartazes cubanos: “Os cubanos, apesar do seu justificado desprezo pelo mundo capitalista e particularmente pela sociedade americana, nunca rejeitaram, pelo menos neste campo criativo, as capacidades técnicas modernas. Na verdade, a tecnologia, por si, não é imperialista ou revolucionária, tudo depende sim do seu uso.”[i][1]
Será importante mencionar entre a plêiade de pesquisadores e criadores do cartaz cubano, o nome de Féliz Béltran, nascido em 1983 e formado nos Estados Unidos onde trabalhou na agência de publicidade McCann Erickson Co., entre 1953 e 1956. Félix Béltran é o autor do cartaz apelando ao poupar de eletricidade e petróleo utilizando apenas a onomatopeia CLIK, o som de um interruptor. Diz Béltran: “Simples é o que não tem de mais e tampouco o que tem de menos.” e afirma “Todo o desenho é social.” [2]

Marshall McLuhan, (1911-1980), teórico da comunicação, deixou-nos escrito: “Os historiadores e arqueologistas um dia descobrirão que os anúncios de nosso tempo constituem os mais ricos e fiéis reflexos diários que uma sociedade pode conceber para retratar todos os seus setores de atividades.”[3] Assim, podemos tirar ilações sobre o que representaram os cartazes cubanos na década de 1960.
Da mesma forma, deveremos fazer uma reflexão sobre a propaganda eleitoral que já nos atormenta em cartazes espalhados em ruas e estradas, pretendendo influenciar a nossa intenção de voto para as eleições autárquicas portuguesas de setembro. Quase que toda essa propaganda é débil de criatividade e imaginação, tecnicamente fraca. Cumpre-se com ela um ritual de vários custos que só poderá influenciar o eleitorado negativamente. Alguma esquerda, que já soube usar essa propaganda com certas doses de talento concetivo, agora também, de uma forma padronizada arrasta-se pelas paisagens com intervenções gráficas anódinas. Poderá o eventual eleitorado esperar da esquerda, deste modo, a imaginação no poder, a competência no poder?
Se McLuhan afirmava que o meio é a mensagem, nós podemos dizer desde já sobre os cartazes eleitorais difundidos neste verão de 2021, que por cá e agora, este meio é uma maçada. O resto das contas fica para depois.
* Alberto Guimarães

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[1] Cadernos do Terceiro Mundo, n.13, abril 1979
[2] https://www.youtube.com/watch?v=GMakNebSMGk visionado em 28/07/21
[3] McLuhan, Marshall, Os meios de comunicação como extensões do homem. Editora Cultrix, São Paulo, 1979. Pág. 262.