Ecossocialismo: a razão de um voto

No centro das propostas da Moção E encontra-se a busca pela superação do capitalismo através de uma resposta ecossocialista. Importa por isso fazer alguma clarificação acerca do Ecossocialismo.

Para além das graves crises sociais e económicas intrínsecas ao sistema capitalista e que bem conhecemos e contra as quais a esquerda socialista tem combatido e proposto alternativas, o avolumar da grave crise ecológica e ambiental trouxe a humanidade,  sobretudo as classes mais desprotegidas, perante o grave risco da sua própria sobrevivência.

Importa recordar que a generalidade da comunidade científica está de acordo que esta será a última década que teremos antes de atingir o chamado “ponto de não retorno” do ponto de vista climático. Isto quer dizer que, para lá desta década a espiral de desequilíbrios climáticos, que já observamos em fenómenos extremos de secas, incêndios, inundações e extinções de espécies, estará fora de qualquer controlo ou previsibilidade. Nesta situação, migrações de populações a uma escala nunca antes vista e provável fome generalizada em grandes partes do globo serão expectáveis.

Neste contexto, em muitos modelos científicos Portugal encontra-se entre os países do hemisfério norte previsivelmente mais afectados pelas alterações climáticas.

A Moção E não alinha assim com quem pensa que o combate pela defesa da ecologia é uma caracterização do socialismo, similar aos combates do feminismo ou antirracista, por exemplo. Estes são importantes combates civilizacionais. O Ecossocialismo junta a estes combates o da defesa da sustentabilidade ambiental, onde o que se joga é a nossa própria sobrevivência, ou seja é o combate existencial. A urgência desse combate advém do horizonte temporal limitado em que a grave crise ambiental nos coloca.

O campo da esquerda socialista, tem assim que construir a superação do sistema capitalista neoliberal em que vivemos a partir de um modelo que conjugue a justiça social e económica com o meio ambiente de forma a garantir uma solução duradoura para além das nossas próprias existências, ou seja, o Ecossocialismo.

Esse modelo económico terá de partir da necessária transição energética, mas não nos moldes que o capitalismo neoliberal propõe. Com a manutenção do poder dos grandes monopólios, e com o mercado a decidir o que e como fazer, bem como quem paga o custo. Os planos para a década apresentados pelo governo, nomeadamente o Plano de Recuperação e Resiliência e o Plano Nacional do Hidrogénio são desprovidos de sustentação técnica e financeira claras. Pior, não se lhes conhecem objectivos de soberania económica (nas suas várias vertentes), calendarização clara ou até número de empregos a criar.  Estes planos do governo PS são autênticos menus de medidas avulsas feitas pelo mercado para garantir a continuação do lucro, sem qualquer participação das populações ou discussão social séria.

A proposta ecossocialista é a da construção de um outro plano para a década, com recuperação da soberania energética, alimentar e financeira.  Um plano de alternativa económica e de sustentabilidade ambiental que põe a qualidade de vida e o emprego acima do lucro.

Pela sua dimensão e complexidade, este projecto será o motor de criação de emprego digno e qualificado que exige a re-qualificação de muitos trabalhadores e será garantia do futuro emprego para os jovens, incluindo a geração mais tecnicamente preparada que as sucessivas crises obrigaram a emigrar desde o tempo da Troika.

A transição energética Ecossocialista passa pela democratização da produção e acesso à energia, através de Comunidades de Energias Renováveis  locais de co-produção e co-partilha de energia através de uma rede de distribuição pública, com polos comunitários.

Mas só isso não chega. É preciso descentralizar as actividades económicas industriais, extractivas, agrícolas e florestais e tornar os circuitos de produção-distribuição-consumo-reciclagem em circuitos de menor dimensão geográfica por forma a reduzir o transporte de pessoas, matérias-primas e produtos, e dando primazia à ferrovia em detrimento do transporte aérea e rodoviário.

A descarbonização e electrificação do consumo de energia nas habitações e edifícios só será possível com a  massificação da produção de painéis solares e outras soluções fotovoltaicas. Urge assim recuperar a produção na fábrica de Moura, adquirida por capital chinês, que logo a fechou para não fazer concorrência às suas fabricas na China. Para massificar o uso de energia solar limpa precisamos dessa e de mais capacidade de produção de painéis solares.

Para além disso temos também de planear e executar um enorme conjunto de projectos de requalificação urbanística, no sentido de aumentar a eficiência energética, e a enquadrar nas propostas autárquicas.

Este contexto e as propostas ecossocialistas deveriam ser a face da proposta do Bloco de Esquerda perante os/as trabalhadores/as e a sociedade. Podem e devem ser enquadradas na construção de programas participativos autárquicos, feitos em diálogo  com as populações, e na execução da eternamente adiada regionalização, instrumento essencial para a execução do objectivo da democratização do desenvolvimento regional e local.

Pedro Abreu

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