Este ano comemorar-se-á o 45º. Aniversário da Constituição da República Portuguesa (CRP), aprovada no dia 2 de abril de 1976, pela Assembleia Constituinte. Apesar das muitas revisões que já sofreu, a nossa Constituição mantém-se como uma das mais progressistas da Europa, mantendo resistências pontuais contra tentativas de alteração com intuitos liberais e contrários à democracia.
Foi nesta carta magna que ficou consagrado expressamente o direito de acesso dos cidadãos aos tribunais, assente no espírito de que por insuficiência económica nenhum cidadão ficaria privado de ter acesso à justiça. Decorrente dos sucessivos atropelos ao espírito da CRP, encetados por políticas desviantes do espírito revolucionário que deram origem a várias revisões, algumas com o intuito de colocar em causa esse direito fundamental, a realidade é que cada vez mais se verifica que o acesso à justiça não é igual para todos, havendo uma justiça para pobres e outra para ricos, como se diz na gíria popular.
A realidade é que um cidadão com carências económicas não tem o mesmo tratamento que um outro numa situação social e económica mais folgada. É do conhecimento público que o acesso à justiça está diretamente ligado à situação social e económica de cada cidadão.
Embora esteja consagrado na CRP como um direito enquadrado no regime geral dos direitos fundamentais, onde se encontra também o princípio da universalidade e o princípio da igualdade, na prática não passa do papel.
Considerando que estamos integrados num Estado de Direito, todo o cidadão deveria ter acesso à proteção jurídica e às garantias processuais e procedimentais. Tal princípio constitucional encontra-se ferido na sua aplicação.
O acesso à justiça emperra logo no início na proteção jurídica de que um cidadão tem direito, uma vez que antes de participar contra outro, na defesa dos seus direitos, criminais ou civis, terá de pensar primeiro se tem possibilidade de suportar os encargos com a consulta de um advogado.
De seguida o cidadão esbarra com as obrigações junto dos tribunais, quanto à taxa de justiça que é uma das fronteiras mais difíceis de ultrapassar, pelo seu valor exorbitante.
E mesmo que sigam a via da proteção jurídica, com o objetivo de ficar isento das taxas de justiça e demais encargos processuais, só o tempo que se aguarda pelos despachos do Instituto da Segurança Social, depois de lhe ser exigido uma manancial de prova documental quanto ao agregado familiar, rendimentos, propriedades, já prescreveu ou caducou o direito que pretendia defendido.
É notória a diferença entre os megaprocessos, que duram anos e anos até que se inicie o julgamento, quando não prescrevem antes, em que os «clientes» são cidadãos muito diferente daqueles que recorrem à proteção jurídica/apoio judiciário.
Muitas vezes os nossos governantes, em especial os ministros da Justiça, nos seus programas de ação, nas campanhas eleitorais abanam com a tese da baixa das taxas de justiça, que na prática se vai agravando consoante a dificuldade de cada cidadão.
Num momento de pandemia, em que as famílias se defrontam com enormes dificuldades na manutenção de emprego ou de confronto com os senhorios, os prestadores de serviços, as operadoras de telecomunicações, fornecimento de produtos essenciais, como água, eletricidade e gás, o governo deveria de alterar a legislação quanto às taxas de justiça e demais custas e encargos judiciais.
Não temos dúvidas de que a justiça não é a mesma para todos!
* Adelino Granja
